domingo, 19 de janeiro de 2020

Elke Maravilha: uma Joia Rara em Todas as Linguagens

De origem russa com ascendência alemã e naturalização brasileira, Elke Georgievna Grunupp foi uma importante figura artística de seu tempo. Modelo, apresentadora, cantora, atriz, jurada de calouros, performer, empresária, ativista e maravilhosa em tudo o que fazia, Elke é uma forte inspiração para mim desde a infância. Confessado isto, nesta postagem gostaria de falar sobre a breve e rápida passagem de Elke pela música.

Em 1980, Elke lançava juntamente com Cidinha Campos e Berta Loren, o seu primeiro trabalho fonográfico: o registro da apresentação do stand up "Humor Só Para Mulheres", que tinha como intuito desconstruir o machismo presente na comédia brasileira.

Em 1983, Elke já era uma celebridade reconhecida para o grande público. Com o sucesso de sua presença e opinião em corpos de jurados, por meio da gravadora Chantecler, Elke lançou o seu primeiro e único LP em vinyl 7'', contendo apenas duas canções, uma em cada lado do disco. A produção sonora misturava a suave e descontraída voz de Elke com elementos de funky e soul music, adicionado ao rock e à MPB. 

No lado A, com a canção "Jóia Rara", Elke declama sua personalidade ao público: "quem sabe, sabe, me conhece, gosta...se me criticarem, eu viro as costas". E assim declara que é uma joia rara na indústria do entretenimento. Disso muitos já sabiam, outros nem tanto, pois os anos oitenta foi um período de transição na imagem de Elke, o que dividiu a opinião do público em massa.


A canção tem uma atmosfera carnavalesca, Elke se diverte com as brincadeiras de sua voz, com gritinhos, "uuhs e aaais", revelando um aspecto disco na canção. O mais marcante é a guitarra e o baixo que acompanham as frases sussurradas de Elke. 

Já no lado B, encontramos a canção "Que Vontade de Comer Goiaba", que nos surpreende com uma atmosfera latina, principalmente nordestina. Novamente, Elke brinca com a voz, entre gritinhos e sussurros, elucida diversas frutas e iguarias do norte/nordeste. Declarando seu amor pela terra que escolheu viver. Elke até declara que "se Adão fosse nortista, juro que ele não pecava, em vez de comer maçã, Adão tinha era comido muita goiaba". O refrão desta música é fácil e pegajoso na mente, tem um ar descontraído, pode parecer engraçado, mas no final vai lhe trazer diversão. 

E era assim que Elke Maravilha tornava sua vida uma joia rara, em tudo o que a artista fazia tinha sua personalidade excêntrica de alguma forma. Então, caso vocês tenham interesse em ouvir o disco, basta clicar na imagem abaixo para descarregar o ficheiro.





Que nossa Elke esteja viva e presente em nossas memórias, olhos e ouvidos. 
Uma joia rara nunca perde seu brilho. 
Espero que gostem, até a próxima!

Enjoy!


domingo, 14 de julho de 2019

SKATT BROS: Virilidade Homossexual e Identidade Masculina Em Crise

O início dos anos 1980s foi fortemente influenciado pelos movimentos sociais oriundos desde os 1960's, mas com maior extensão e com suas próprias mídias a partir da transição que se deu entre a disco music setentista para o pop-rock oitentista. A boyband Skatt Bros, nasceu nesse contexto. Formada em 1979, pelos músicos: Sean Delaney, Pieter Sweval, Richard Martin-Ross, Richie Fontana e Danny Brant. O grupo foi madrinhado por Grace Jones - artista performática em diversas linguagens: música, cinema, moda e artes visuais. 

O selo de garantia dado por Jones, fez com que os holofotes pousassem no disco de estréia da banda: "Strange Spirits", assinado pela gravadora Casablanca Records. O primeiro single de trabalho foi a canção "Walk The Night", que chegou a conquistar o #9 no chart de Disco/Dance Club da Billboard. Esta canção em específico nos pões numa atmosfera de sintetizadores, guitarra pesada, vozes distorcidas e um "ar assombroso", algo como "Thriller". O refrão é fácil e repetitivo, já a letra nos conta sobre uma aventura noturna, repleta de suspense. O sucesso do primeiro single fez do grupo uma promessa para o cenário pop. 

Porém algumas contradições na produção da banda fizeram com que a carreira do grupo desandasse, nos deixando dúvidas sobre os motivos que levaram a gravadora a suspender o projeto. A confusão começou quando o grupo foi comparado com outro, já famoso nas rádios: Village People. As comparações são de fato inevitáveis, a mistura sonora é o que mais caracteriza a comparação: country music com disco music, mais pop-rock e sons experimentais. Além de backvocals afiadas nos versos complementares. 

Bons exemplos dessa "mistureba dançante", são as faixas: "Dancin' For The Man"; "Fear Of Flying"; "Strange Spirits", "Old Enough" e "Life At The Outpost", esta última tornou-se também single, ganhando até produção de videoclipe. Como vocês podem assistirem acima. Eis que aqui há o rompimento lógico dessa história. 

Não se sabe bem o que aconteceu, mas os boatos seguem sobre questões homofóbicas. A banda tomou popularidade na comunidade gay que tornava-se cada vez mais popular. As comparações com o Village People, levou a gravadora a querer manter a estética caricata dos personagens masculinos. Nesse caso, apenas o cowboy foi o personagem destacado. No vídeo, os homens que aparecem não são os verdadeiros integrantes da banda. Representam cada um - de forma mais erótica, digamos. Exaltando a virilidade do homem cowboy, em movimentos de dança e na letra. O vídeo causou problemática entre os integrantes, que romperam contrato com a gravadora, mas não ficaram muito tempo fora da ativa. Logo em seguida, no quente do sucesso (e da polêmica), em 1981 - pela gravadora Polygram, o grupo real lançava o álbum "Rico and the Ravens", apenas na Australia. Se refugiando ou tentando se desvencilhar da imagem homossexual que "fizeram deles".

O segundo álbum tem sonoridade menos alegórica, a disco music perde espaço para o pop-rock mais condensado e menos festivo. A mudança, seja de gravadora ou estética musical, não foi positiva para os músicos do grupo. Fazendo com que as atividades do Skatt Bros se encerrassem logo em seguida. Sem nenhum single ou música de destaque.

Confuso e contraditório, não? Um grupo que foi madrinhado por ninguém menos que Grace Jones, ganha popularidade e sucesso nas discotecas, mas logo depois recusa-se a veicular a música do grupo como uma "música gay". O fato é que, o grupo até hoje divide opiniões a cerca disso, mas o único álbum ainda lembrado e requisitado em algumas listas cults de músicas do universo queer, é o primeiro: "Stange Spirits", que ironicamente narra sobre aventuras e peripécias de corpos noturnos.

O disco, além das já comentadas, também deixa espaço para uma harmonia romântica e mais calma, como nas faixas: "Midnight Companion" e "Someone's Taken My Baby", a influência da música country americana é bem evidente. 

Caso vocês tenham se interessado em ouvir o som do Skatt Bros, confesso-lhes que é como um guilty pleasure: cafona, mas divertido, polêmico, mas bobo. Abaixo segue o link para vocês acessarem o álbum disponível nas plataformas de streaming.





Enjoy!

quinta-feira, 20 de junho de 2019

A Ternura e o Choroso Bolero de Menina de Lourdes

Os anos de 1960s foi marcado pelo movimento Jovem Guarda na música brasileira. Fenômeno radiofônico nas cidades paulistanas e cariocas, onde Erasmo Carlos, Roberto Carlos e Wanderléia protagonizaram os sucessos de uma geração influenciada pela ideologia de "Paz & Amor", oriunda dos movimentos de resistência no Reino Unido e Estados Unidos, e comercializada entre jovens de classe média brasileiros. Os temas circulavam entre amor, amizade e curtição. Um contraponto aos interesses dos compositores do que se - vulgarmente popularizou - como "velha guarda". 

Menina de Lourdes foi uma estrela efêmera desta "velha guarda", esquecida entre os botecos de hoje em dia. Amor e solidão são os assuntos de maior relevância. A poética desses artistas circulava-se na atmosfera cinematográfica americana dos anos 1950s. Exemplo disso foi a gravadora Continental Discos, que desde a década de 1930s realizou diversas regravações de canções internacionais. A intenção dos empresários era popularizar os ritmos exteriores com letras em português. Reproduzindo modelos de sucesso empresarial na indústria fonográfica e radiofônica internacional. 

Menina de Lourdes nasceu nesse período "mágico do cinema", em 1941 na Gália Paulista - São Paulo, na região de Marília. Lá, ainda na infância, começou sua carreira artística, e já demonstrava interesse na música. Posteriormente, quando adolescente, começou a cantar com o Conjunto Três Américas e não parou mais até seguir carreira solo. Menina ainda colaborou com Pedrinho & Sua Orquestra, e Enrico Simonetti.

Em 1962, com vinte e um anos de idade, Menina mudou-se para o Rio de Janeiro e fechou contrato com a Continental Discos, lançando assim seu disco homônimo - e único da efêmera carreira. A canção "carro-chefe" do seu disco de estréia foi o sucesso "Terceira Noite", regravação do sucesso italiano "La Terza Luna", de Neil Sedaka. Além desta regravação, no disco também encontra-se a versão brasileira para o sucesso "Treat Her Right", do grupo norte-americano The Bombshells, e Muñequito de Yara Flores. Além dessas regravações, no disco também contém canções autorais, como: "Coração de Pedra"; "Por que"; "Eternos Namorados" e "Carta de Amor".

Menina de Lourdes ficou conhecida como a "cantora chorona", tanto por causa das letras de suas canções, como pelo fato da cantora ter chorado nas duas noites que apresentou-se para o público carioca no Rádio Nacional do Rio de Janeiro. A imprensa realizou algumas matérias sobre Menina, mas sempre focava seu talento como algo a ser exaltado por algum futuro marido. Tornando-a numa espécie de modelo. Não sabemos bem qual foi o desfecho de Menina de Lourdes, mas a transição entre o bolero para a jovem guarda, fez com que artistas entre os movimentos comerciais, fossem esquecidos. Principalmente artistas mulheres que tinham seu talento abafado pela questão social de seu gênero sexual.

O fato é que, dentre meus discos favoritos, Menina de Lourdes está entre eles e consegue me transmitir ternura, sofrimento e compaixão. Letras como das canções "Carta de Amor" e "Coração de Pedra", revelam uma cantora delicada, sentimental e apaixonada. Com uma voz suave mas ao mesmo tempo grave. Revelam talvez uma mulher enganada pelo amor dos homens, ou enganada pelos aplausos dos mesmos.

Para quem gosta de bolero brasileiro, ou ficou curioso para conhecer a voz de Menina de Lourdes, você pode descarregar o ficheiro especial, com as faixas: "Coração de Pedra"; "Pisando de Mansinho"; Onde Está a Felicidade" e "Receita pra Ser Feliz", clicando na imagem abaixo:



Enjoy!

terça-feira, 14 de maio de 2019

ELENA MADERA: a voz e o ritmo rocking-flamenco da mulher cubana


Elena Madera foi um talento arrebatador de sua época. Filha de bailarina cubana e de um líder de banda norte-americano, começou a cantar ainda criança com quatro anos de idade. Dois anos após sua chegada aos Estados Unidos. 

Na realidade, pouco se sabe do histórico pessoal da artista. Com a mesma intensidade de sua estréia, seu desaparecimento também foi. Elena, por exemplo, é um caso de artista que não possui perfil no site de pesquisa Wikipédia - considerado um banco popular de informação na internet. 

Quando conheci seu som, o ritmo de flamenco e a voz performática de Madera, prendeu-me. Desde então, procuro peças sobre sua história.


Elena nasceu em Havana - Cuba. Sua mãe era bailarina profissional e seu pai estava no país à trabalho. Pouco se sabe do romance, como também os motivos aos quais levaram a família ter que se mudar para Filadélfia, na Pensilvânia. Seu pai era "líder de banda" e um homem articulado na sua cidade de origem. Sempre incentivou o talento de sua filha para a música. Na adolescência com apoio de seus pais, Elena começou a cantar em bares e casas noturnas. Mas por causa da grande competição entre cantoras, Elena precisou utilizar-se de elementos diferentes para se destacar. Foi então que seu jeito de cantar, foi considerado "estranho", "engraçado" ou "exagerado". 

Em 1958, Elena lançava seu primeiro álbum de estúdio: "La Voz de Pasíon". Com orquestra e direção de Johnny Conquet, e selo da Decca Records. A primeira canção de sucesso deste álbum, foi "Pepito", que conta a história de um relacionamento amoroso, onde o "adorado" canta a "voz do amor" para Elena, embora ele nunca tivesse compreendido por si mesmo, ela acreditava nesse "doce amor". Ela acreditava nele. 

Madera apresenta uma canção mista, onde mistura elementos de música flamenca com rock. Com forte referência ao cenário rock dos anos de 1950, nos Estados Unidos, a canção possui atmosfera tropical e toques de rock-tinged na melodia, além de um harmônico backvocal de "uuhs" e "oohs". "Pepito" conquistou as rádios do nordeste norte-americano, ficou entre as mais tocadas durante semanas. Fazendo de Elena uma promessa.

Com o sucesso de seu primeiro disco, Elena foi convidada por Lou Perez para juntos gravarem um novo disco. E assim foi feito, em 1961, foi lançado o álbum "Que Buena Esta...Elena!!", contendo 12 músicas, seis de cada lado. Perez disse que este trabalho seria a grande estréia de Elena para o estrelato internacional. E de fato a parceria rendeu muitos frutos para a dupla. Elena seguiu em turnê com Lou Perez a fim de divulgar o novo trabalho, que obteve êxito com as canções "Sandunguera", "Abandonada" e "Que Buena Esta Elena". Essas músicas representaram bem a mistura de ritmos que Elena mantinha presente em sua performance. Ritmos como pachanga music, que possuía origem no merengue cubano, rock-tinged, música afro-cubana e guaracha, ritmo folclórico cubano que ficou popular através de apresentações teatrais no início do século XX.

A tórrida voz de Elena, como Lou Perez dizia, chamou atenção de outros artistas de sua época, como: Tito Puente e Duke Ellington. Elena foi convidada a participar de apresentações com ambos, todavia não há nenhum registro das apresentações, assim como outras demais informações. Elena sumiu e a internet ainda não obteve todos os arquivos de seu trajeto.

Porém, o álbum "La Voz de Pasíon" está entre nós. Caso tenham interesse, segue abaixo o ficheiro do disco. Basta clicar na imagem para descarregar o arquivo.




Neste álbum, particularmente, destaco as canções "Quisiera Saber"; "El Timbre"; Mas Piano Merengue" e a regravação de "Noche de Ronda", onde revela toda a excêntrica identidade de Elena. Com uma interpretação irreverente, nesta faixa compreendemos bem o que se diziam sobre a "voz tórrida" e o fenômeno que ela causava no público.

Espero que tenham gostado de conhecer um pouco - do pouco que se sabe - sobre a vida desta mulher e artista cubana, radicada na América, mas cheia de suingue latino. Infelizmente, Elena Madera é mais uma artista feminina à estar no "quadro do esquecimento". Porém, enquanto alguém ouvir sua música, sua arte estará viva e presente.

Enjoy!